sábado, 2 de maio de 2009

Preconceito culposo

Em direito, o crime culposo é aquele que resulta de ato negligente, imprudente ou inábil do indivíduo, embora não tenha tido a intenção criminosa. Assim defino o preconceito culposo, em que a pessoa não tem a intenção, mas por negligência (ou ignorância) o comete, e acredito que na maioria das vezes sabe do risco de parecer preconceituoso. Mas acha que o deficiente não vai levar pra esse lado.
Acho que a grande maioria dos cadeirantes já passou por isso, cito dois casos em que este tipo de preconceito é nítido. Um é o relato do Evandro no Tocando a Vida Sobre Rodas, o outro foi uma experiência de um namorado de uma cadeirante no Assim Como Você, do Jairo Marques. Eu também já passei por situações assim, mas da última vez tive que rir. Fui ao cinema no BH Shopping, entrei na fila de prioridade e minha namorada pediu dois ingressos, pra mim meia entrada por ser deficiente (não há lei pra isso, mas alguns cinemas nos dão este privilégio). Mal pude acreditar quando a atendente perguntou pra ela se eu tinha alguma "carteirinha" pra provar que eu era deficiente. Fala sério.
Na hora eu entrei no meio e perguntei "não está vendo que estou numa cadeira de rodas?" e a moça teve a coragem de dizer "você pode só estar usando". Se não fosse um risinho, em tom de piada que ela deu ao fim da frase, meio que brincando, eu tinha apelado. Juro. Mas como pareceu brincar, eu só disse "é bem capaz de eu gastar mil e quinhentos reais em uma cadeira de rodas e pagar esse mico todo pra conseguir sete reais de desconto no cinema." Ela entregou os ingressos e sorriu sem graça.
Só pude interpretar que a moça é nova no trabalho, deve ter sido treinada exaustivamente para pedir sempre a carteirinha para estudante e identidade para idosos, quando pedirem meia entrada, que soltou essa pérola da "carteirinha de deficiente". Não foi por mal (espero que não), mas foi extremamente preconceituosa na interpretação da regra. Incrível que pra isso treinem as pessoas, mas para tratar o deficiente com respeito, dando prioridade, sendo no mínimo atenciosa ninguém deve falar nada, pois é a minoria. Triste, né?
Em outra situação, vivi a mesma história contada no Assim Como Você. No mês passado, na semana santa, fui a São Paulo e quando passeava com minha namorada na Fnac, resolvemos tomar um café. O "café bar", muito chique, ficava no andar de cima, e tinha uma escada rolante, mas pra um cadeirante... tive que dar uma volta, mobilizar três funcionários para utilizar o elevador do prédio, em outra entrada, e entrar por outra porta no andar de cima. Tudo bem, já me acostumei com isso.
Aí tomamos nosso café, fiquei brincando com ela de adivinhar quem era rico, quem era pobre 'infiltrado' no mundo dos ricos, como nós. Rimos bastante, e de repente a moça que estava sozinha na mesa atrás da gente levantou e disse "dá licença". Pensei "ih, vai brigar porque falamos que ela era infiltrada, deve ter ouvido" mas a moça me solta um "não resisti, tinha que dizer que vocês formam um casal muito lindo". Agradecemos e ela foi embora, lembrei na hora do relato no blog do Jairo. É legal isso, ela não teve má intenção nem nada, mas em São Paulo, uma pessoa desconhecida abordar assim e falar uma coisa dessas, não é normal. Fica parecendo que quis dizer pra minha namorada "parabéns por aceitar esse cara todo quebrado e ainda tratá-lo bem". Não foi a primeira vez, e não condeno quem faz isso, adoro ouvir que somos um lindo casal, mas que tem um culposozinho de leve, tem.
E teve pior. Certa vez, um cara da minha idade perguntou pra minha namorada se as pessoas não acham estranho ela ser muito bonita e estar comigo, sair pra todo lado e andar junto. Na hora não acreditei muito no que ouvi, fiquei atônito, só falei "não, nunca aconteceu". Se acontecesse de novo eu falaria "sim, perguntam se ela além de bonita é rica e inteligente, pra ficar com um cara tão bacana não pode ser só bonita."
Portanto, quando passarem por isso, lembrem-se do "preconceito culposo". Acontece muuuuito!

20 comentários:

  1. As vezes da vontade de chutar o pau da barraca mesmo, mas eu me controlo e no fundo quem fica com pena das pessoas sou eu, sou 10 vezes mais feliz que elas.

    Parabéns pelo post.

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  2. qual as coisas que vc gostaria de fazer mais não pode por causa do preconceito?

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  3. ah gostei mt do seu depoimento !
    eu to fazendo um trabalho sobre cadeirantes e me ajudou muito!!
    beijos e muitas felicidades.
    ass: Lanii Moura
    lanii_moura@hotmail.com

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  4. boa maneira de expressar erros dos cidadoes de hoje em relacao a cadeirantes, que sao como todos os outros que nao sao tao diferentes assim : apenas só conseguem andar.

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  5. kraa
    mtt bom esse depoimento...
    Estou fazendo um artigo sobre o preconceito contra cadeirantes e isso me ajudou bastantee!
    valeww
    parabéns!

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  6. sou cadeirante ,já sofri muitos preconceitos,mas a cada dia descubro que os precnceituosos sabem da sua incapacidade e querem descoragem os que podem ultrapassa-los.

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  7. oi!
    DOREI O SEU DEPOIMENTO
    ESTOU FAZENDO UM TRABALHO DA ESCOLA SOBRE
    PRECONCEITO E MEN AJUDOU MUITO
    OBR
    XAUUU

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  8. Estou fazendo um trabalho de conclusão do curso da Brigada Militar e o tema é preconceito. Ler seus relatos me ajudará muito, e com certeza ajudará aos meus colegas a serem profissionais mais preparados. Parabéns pelo blog!

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  9. seu blog me ajudou demais. estou fazendo um trabalho de conclusão de módulo, e o meu tema é a concientização de como receber um cadeirante em uma escola. de coração MUITO OBRIGADA !!!!
    que Deus te abençoe muito.!

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  10. Sou tonim cadeirantefeliz@hotmail.com infelizmente ainda existe muito preconceito e discriminação a cadeirantes em nosso paiz, gostei do dezenho

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  11. o primeiro comentário está meio equivocado, ele não pode chutar a barraca UHASAUHSUAUSHUHAS

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  12. Carla

    Até parece que o mundo tem que girar em torno de você. Você acha que é o único que tem problemas com cinemas ou que e mal interpretado?
    Fala sério. Nossa sociedade tem vários problemas mas você não é o único que está insatisfeito. Agora se incomodar com um comentário é coisa de recalcado.

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  13. Olá! Muito legal o seu texto, cuja ilustração tomei a liberdade de usar em uma prova que preparei para meus alunos. Apesar de não ser cadeirante, entendo perfeitamente o problema que você está apontando. No final das contas, todo mundo tem alguma dificuldade especial, seja de locomoção, de visão, de relacionamento, de astral, do que for. Muita gente, é claro, incorre no preconceito culposo com a melhor das intenções, mas acho que falta muito preparo e informação, e às vezes as pessoas simplesmente não sabem como lidar com quem é diferente delas. Essa é uma questão importante, e você a abordou com pertinência. Felicidades!

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  14. Ana Cristina
    olha Ñ GOSTEI MUITO DO SEU DEPO.Ñ POR VC SER CADEIRANTE MAIS POR FICAR CITANDO COISAS MATERIAS QE Ñ TEM NADA HAVER, VIVA MAIS MAIS E SEJA FELIZ O QE OS OUTROS PENSAM PROBLEMA .. FELICIDADES.

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  15. fabiano Lordelo!
    Tenho 21 anos e venho passando por constrangimentos semenhantes a qualquer preconceitos contra um cadeirantes! NAMORO HÁ 8 MESES, E A ÚNICA COISA QUE A FAMILIA DELA SABE FAZER É CRITICAR, QUERENDO VER O FIM DO NOSSO RELACIONAMENTO, QUE ESTAR TÃO BEM, APENAS PELO SIMPLES FATO DE EU ANDAR EM UMA CADEIRA DE RODAS!

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  16. passei por inumeras situações assim ...sou cadeirante e minha namorada não.uma senhora disse "ahhhh ele tem namorada...(pausa) e ela é BONITA"RSRS outra "não vai maltratar ele não hein"
    mendigo diante de minha negativa e dar dinheiro "aleijado,cada um tem o q merece"
    Não queremos pena não e o fato de dividirmos tal situação não é uma manifestação de autocomiseração.Mostra que há muito a esclarecer e conquistar.Somos pioneiros e agentes de uma sociedade mais justa e mais inclusiva.Não ha como combater o preconceito se não o conhecermos!!Um abraço brother e parabens pela iniciativa do blog meu e-mail é mpol72@hotmail.com

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  17. nossa gostei muito mesmo eu irei falar também sobre cadeirantes no meu blog eu amei muito meu blog é esse aqui
    http://fabriciosilvaborges.blogspot.com

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  18. Estou passando por essa situação aqui em Natal/RN, no Teatro Riachuelo. Fiquei totalmente pra baixo quando a moça falou que cadeirante não tem direito a nada. Poxa, eu ganho pouco, tudo para deficiente é caro, quase não saio de casa e qd quero ver um show, sou barrado ou compro a entrada inteira e sem direito de reclamar. E apesar de não ter ficado tetraplégico, fraturei a coluna inteira num acidente. Preciso de acompanhante e nem isso tenho direito.

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  19. Muito obrigada por esse depoimento,agora sei como se sentem estou apoiando vcs e também fazendo um trabalho sobre o preconceito contra os cadeirantes

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