terça-feira, 19 de maio de 2015

Lancha adaptada para deficientes

Uma rampa facilita muito embarque e desembarque
Quem acompanha o blog sabe que pude retomar um dos esportes que mais curto em 2013, o mergulho. Mergulho adaptado não demanda muita estrutura, basta fazer o curso específico e ter o acompanhamento correto na hora do mergulho. Uma luva tipo "mão de pato" é um dos poucos equipamento que pode ajudar na prática do mergulho adaptado, mas tem um detalhe que pouca gente percebe, e que poderia fazer toda a diferença: uma lancha adaptada. Já tive problemas em mergulhos, tanto para embarcar no porto quanto para voltar ao barco em alto mar, pois nunca tinha visto uma embarcação que oferecesse alguma facilidade para o cadeirante.
Não tinha visto até mês passado. Recebi um e-mail do Jonny, de Santos, apresentando uma lancha adaptada para deficientes. Ela tem uma tampa na parte da frente que se transforma em uma rampa, permitindo a uma cadeira de rodas entrar com facilidade. A ideia surgiu da indagação do Jonny sobre como seria ter os movimentos limitados e querer aproveitar um passeio de lancha ou algum esporte náutico, como o mergulho. E não existia nada neste sentido no Brasil. Agora já estão operando lanchas adaptadas em Ilha Bela, São Sebastião e Ubatuba no litoral de São Paulo.
Embarcar e desembarcar cadeirante é uma operação de guerra
E o Jonny acertou em cheio. Desde a primeira vez que entrei em um barco depois de cadeirante senti na pele a dificuldade no embarque. Foram precisos quatro homens para me colocar no barco, em uma operação tensa. Afinal, o barco não parava de balançar e sempre havia um espaço entre o barco e o cais. Com muita força conseguiram me colocar para dentro. Depois, para pular no mar, outra dificuldade. Mesmo o barco tendo um rebaixamento atrás, haviam degraus que tive que pular um a um até chegar na beirada, e então saltar para o mar. Se houvesse uma rampa, ficaria muito mais fácil.
Mergulhadores voltando ao barco com facilidade
Mas a maior dificuldade mesmo eu senti na volta. Para voltar ao barco foram três pessoas para me "içar" de volta. E já passei coisa pior, em um mergulho no naufrágio do Victory 8B em Guarapari, o barco tinha uma escada de metal em forma de espinha de peixe, e como o mar estava bravo, bati as pernas várias vezes ali, o que gerou vários hematomas e ainda dei sorte por não quebrar nenhum osso. Com uma lancha adaptada não teria este problema. A rampa entra na água e permite aos mergulhadores, com ou sem deficiência, sair e entrar no barco com facilidade.
Até mesmo mulheres de saia ou vestido podem se beneficiar da lancha adaptada
Além de funcional, a lancha é muito bonita
A lancha adaptada pode atender não só cadeirantes como também um obesos, idosos ou pessoas com dificuldade de locomoção. Espero que operadoras de mergulho e pessoas que queriam proporcionar opções de lazer náutico a todos tenham interesse neste novo tipo de embarcação. O email do Jonny é msjk@uol.com.br e o telefone (12) 99772-0082.

domingo, 3 de maio de 2015

Palestra - Desafios do lesado medular

Contando um pouco da minha história e dos desafios que enfrentei - e enfrento até hoje
No último sábado de abril ministrei a palestra "Lesado Medular - Um desafio a cada dia", que preparei para o II Simpósio Mineiro de Reabilitação em Lesão Medular, no Hotel Royal, aqui em Belo Horizonte. O simpósio foi organizado pelas fisioterapeutas Joyce e Simone, da AquafisioBH, onde faço hidroterapia, e foi voltado para fisioterapeutas e profissionais envolvidos com reabilitação de pessoas que sofreram lesão medular. A ideia da Joyce ao me chamar foi mostrar um pouco dos desafios que uma pessoa com lesão enfrenta, do ponto de vista do próprio paciente.
Antes da lesão, muito esporte, muita festa, muita diversão
Comecei mostrando como era minha vida nos últimos meses antes da lesão, contextualizando minha situação para que entendessem como reagi após o acontecido e como enfrentei - e enfrento até hoje - os desafios do dia a dia. Falei que estava em um momento muito ativo, morava em Floripa, estava só estudando, fazendo mestrado na UFSC, tinha terminado um relacionamento há pouco tempo e fazia esportes todo dia, ia de bike pra universidade e fim de semana fazia trilha no sábado e trekking no domingo - e ainda tinha balada todo fim de semana e praia sempre que dava na telha. Meu fim de semana começava na quinta feira meio dia, que era quando acabava a última aula da semana, e acabava na terça às oito da manhã, quando começava a primeira aula. Enfim, eu estava com a vida que pedi a Deus.
Nas férias, curtindo com os amigos
Chegaram as férias do mestrado e vim para Minas ver os amigos e parentes. Encontrei a família, amigos e ex rolos e namoradas, curti muito. E uma semana antes de voltar as aulas, aconteceu o acidente. Contei como aconteceu, como fui socorrido e o doloroso processo de hospital em hospital, com a reação da família e tudo mais. E, principalmente, como foi minha reação. Sei que sou um caso muito raro, senão único, pois eu tinha tudo para me desesperar, ficar triste e até deprimido, já que minha vida era muito ativa e livre. Mas usei de minha racionalidade e conhecimento para reagir. Pensei: "já está feito o estrago, não posso fazer nada para reverter isto, então preciso comemorar que estou vivo e retomar minha vida o mais rápido possível". E assim fiz. Afinal de contas, a alternativa era muito pior. Eu poderia estar morto.
Após o acidente, no hospital, ainda de bom humor
Vieram os primeiros desafios, após a artrodese que colocou minha coluna no lugar: entender o funcionamento do corpo, os primeiros movimentos, e as coisas básicas, necessidades fisiológicas, banho, sono. E aí uma coisa que assusta muita gente: a cadeira de rodas. Ao contrário de muita gente que não aceita virar cadeirante, ficar "preso" à cadeira de rodas, eu estava doido para ir para a cadeira logo. Afinal, eu já estava de cama há uns quinze dias, por causa da cirurgia. Rodava para todo lado, mas ainda não podia sair. Mais alguns dias e convenci uma enfermeira a me levar para fora do hospital, mesmo sem poder. Foi incrível ver o céu novamente. Aí que fiquei ainda mais ansioso para sair rodando de cadeira de rodas.
Entre os primeiros desafios, as transferências, no início com a tábua do Sarah, depois sem ela
Saindo do hospital, novos desafios. Primeiro, adaptar a casa para mim. Depois, fazer fisioterapia. Já tinha começado no hospital, consegui fazer em casa graças ao programa de Home Care do meu plano de saúde. Com fisioterapia consegui melhorar o controle do corpo, ganhar força e melhorar as transferências. Aí consegui a internação no Sarah, que me trouxe muita informação sobre a vida na cadeira de rodas. Depois disso, dirigir foi o que quis fazer primeiro. Sabia que o carro iria me dar muita autonomia e liberdade. Tirei carteira adaptada, comprei carro adaptado, e aí ninguém mais me segurava. Ia sozinho para a fisioterapia em clínica, voltei ao mestrado e ia sozinho para as aulas, e para onde mais tivesse vontade. Nesse meio tempo, outros desafios surgiram e fui superando, como sair à noite, namorar, praticar esportes, viajar. 
Dirigir foi uma das primeiras coisas que quis voltar a fazer
E claro, para tornar tudo possível, precisei também voltar a trabalhar. Aqui um adendo: muita gente consegue aposentar por invalidez, mesmo em condições de trabalhar, e se acomoda. Acreditem, se a pessoa tem condições, vale muito à pena voltar. E o melhor caminho é concurso público, não há dúvida. Tentei um processo seletivo, fui muito bem nele, mas não fui chamado. Descobri depois que a empresa tinha escadas na entrada. Parece que não quiseram ter o trabalho de adaptar... Percebendo isto, achei que valia a pena tentar concurso. E consegui de primeira. Isso mudou minha vida, e só cheguei onde estou, consegui muita coisa, por ter voltado a trabalhar.
Após vencer os primeiros desafios, quis me desafiar cada vez mais
E então resolvi criar novos desafios, já que consegui superar todos até aquele momento. Corri atrás de tudo que curtia fazer antes da lesão, e mais. Muito mais. Quem acompanha o blog sabe disso. Foi depois da lesão que fiz a primeira grande viagem ao exterior - já tinha ido a outros países vizinhos, mas outros continentes só fui como cadeirante. Pratiquei esportes que sempre quis depois da lesão, conheci muita gente bacana e continuei saindo, viajando e encontrando com amigos sempre que quis - ou melhor, faço isso sempre que quero. Muita gente diz que sou mais ativo que muita gente que anda, e é verdade. Isso tudo apesar do maior desafio que ainda enfrento até hoje após a lesão - a dor. Sofro de dor crônica, muito forte, constante, vinte e quatro horas por dia. E ainda assim faço de tudo.
Ah, claro, contei meu segredo para superar tudo bem e o que me dá força para sempre seguir em frente. Para fechar a palestra, preparei um vídeo que mostra um pouco de tudo que falei. Ficou muito legal, compartilhei nas redes sociais e bombou. Confiram acima! A recepção do público foi ótima, uma das pessoas falou que foi a melhor palestra, fiquei muito satisfeito. 

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